29 de Outubro, 2019
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O que é e como prevenir a Leishmaniose Visceral em cães
A Leishmaniose Visceral, também chamada de calazar, é uma doença grave que acomete principalmente cães, mas que é transmitida a humanos frequentemente, sendo uma zoonose de grande importância no Brasil e no mundo.
Segundo o Ministério da Saúde, está classificada entre as 6 endemias prioritárias no mundo. Neste artigo você vai entender como é a transmissão dessa doença, a diferença entre a Leishmaniose Tegumentar e a Leishmaniose Visceral, como é o tratamento, e principalmente, como prevenir que o cão seja infectado.
A Leishmaniose Visceral
É uma doença infecciosa causada por parasitas do gênero Leishmania, onde o cão é o principal hospedeiro. Outros mamíferos também podem ser infectados, inclusive o gato. A sua importância se deve ao fato de ser uma zoonose, com grandes chances de levar o cão e o homem a óbito. O Brasil responde pela maioria dos casos de Leishmaniose Visceral nas Américas, onde o número de casos vem aumentando de forma alarmante.
Transmissão e ciclo biológico
A Leishmaniose zoonótica é causada pelo protozoário Leishmania infantum, e transmitida durante a picada da fêmea de um inseto hematófago, conhecido popularmente como mosquito-palha (Lutzomyia longipalpis). Esse vetor é um flebótomo que se reproduz em locais úmidos, com matéria orgânica e vegetação. Os cães domésticos participam da disseminação da Leishmaniose visceral causada por L. infantum pois são o principal reservatório desse parasita no Brasil, especialmente em áreas urbanas. Animais silvestres, como lobos, coiotes, gambás e raposas, também podem funcionar como reservatórios.
A transmissão ocorre quando o vetor (mosquito-palha) ingere macrófagos (células de defesa) parasitados por formas amastigotas de Leishmania sp. O protozoário se multiplica e se diferencia dentro do organismo do vetor. O ciclo biológico completa-se com a picada do vetor infectado e subsequente inoculação de formas promastigotas do parasita na corrente sanguínea de um novo hospedeiro vertebrado, como o cão ou outros mamíferos. A Leishmaniose não é contagiosa diretamente, necessitando do inseto para ocorrer a transmissão entre as espécies. Porém, pode ser transmitida pelas vias transplacentária e venérea.
Patogenia
As formas infectantes são liberadas na epiderme do hospedeiro e fagocitadas por macrófagos. Dentro dessas células, elas se diferenciam em amastigotas, multiplicando-se intensamente. Os macrófagos rompem-se e liberam essas formas, disseminando pelo sangue e vias linfáticas, acometendo o sistema imunológico. A Leishmania pode se disseminar para órgãos como pele, baço, medula óssea, fígado, causando uma infecção crônica. Normalmente, os sinais clínicos aparecem entre 2 a 12 meses após a inoculação do parasita. Entretanto, o animal infectado pode ficar clinicamente saudável por um longo período, permanecendo como reservatório da doença com capacidade de infectar o vetor, dando continuidade ao ciclo.
Sintomas da Leishmaniose Visceral
Os sintomas são muito variados e pouco específicos da doença. Entre os sinais, estão: letargia, anorexia, febre, perda de peso, dificuldade locomotora, vômito, diarreia, polidipsia, epistaxe (sangramento nasal) e sangue nas fezes. Os sinais cutâneos são comuns, e incluem alopecia em volta dos olhos, nas orelhas e ponta de cauda, dermatite, unhas anormalmente compridas e frágeis, descamação, despigmentação, úlceras, ente outros. No exame físico, encontra-se frequentemente linfoadenomegalia, esplenomegalia, uveíte, mucosas pálidas e conjuntivite.
Nos exames laboratoriais podem ser encontrados níveis aumentados de ureia, creatinina e proteína total no soro. Anemia, trombocitopenia e leucopenia são achados comuns também.
Diagnóstico da Leishmaniose Canina
O diagnóstico clínico é bastante complexo, visto que os sinais clínicos não são patognomônicos. Exames laboratoriais, dados clínicos e epidemiológicos devem ser utilizados para fechar o diagnóstico. A confirmação da doença é feita pelo diagnóstico laboratorial baseado em exames sorológicos e parasitológicos. São utilizados o teste com pesquisa de anticorpos, como ELISA e a Imunofluorescência Indireta, exames diretos como esfregaços de punções de fígado, baço e raspado de pele. O PCR deve ser recomendado e utilizado também como método diagnóstico para confirmação do DNA do parasita.
Tratamento
A indicação para o tratamento de um animal com Leishmaniose é bem atual dentro da medicina veterinária, pois até então, este tópico gerava muitas dúvidas, discussões e controvérsias.
Antes de tudo, deve-se avaliar se é possível tratar o animal doente corretamente. Alguns animais não respondem bem à terapia, em outros casos, o proprietário não pode arcar com o tratamento, sendo indicada a eutanásia do cão. Essa indicação ocorre porque cães não tratados geralmente vão a óbito, e serão reservatórios da doença até então.
O tratamento da Leishmaniose Visceral Canina pode ser feito utilizando um único medicamento devidamente registrado no MAPA (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento) para este fim. Este tratamento representa uma cura parcial clínica e epidemiológica, onde o animal não apresentará lesões e sinais da enfermidade, porém o parasita continuará vivo dentro do organismo do cão infectado. É proibido o tratamento da leishmaniose visceral em cães infectados ou doentes, com produtos de uso humano ou produtos não registrados no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA).
Terapias de suporte visando melhorar o estado geral de saúde do animal e amenizar os sinais clínicos podem ser utilizados como complemento do tratamento principal.
Conforme exposto acima, o tratamento não traz a cura definitiva, resultando em uma redução significativa da carga parasitária, e consequentemente, a transmissibilidade da doença. É necessário realizar o acompanhamento clínico pelo médico veterinário por toda a vida do animal e também, o manejo preventivo destes animais tratados.
Prevenção da Leishmaniose Visceral Canina
A melhor maneira de conter a Leishmaniose é através da prevenção. Podemos dividir as medidas preventivas em 3 frentes:
Evitar a picada do vetor no animal:
Para prevenção direta ao cão, é recomendado o uso de inseticidas tópicos que repelem o mosquito. Segundo a OMS (Organização Mundial da Saúde) em seu relatório do Comitê de Controle de Leishmaniose de Genebra, ocorrido em 2010, demonstrou-se que o uso de inseticidas tópicos com eficácia comprovada contra picadas de flebotomíneos (colares impregnados com deltametrina ou formulações spot on à base de permetrina) reduzem significativamente a incidência de leishmaniose visceral em cães e humanos, dependendo do nível endêmico em uma determinada área. É importantíssimo seguir as recomendações de bula desses produtos, pois após algum tempo é necessária a troca da coleira ou a reaplicação do produto spot on para a manutenção da eficácia.
Recomenda-se o uso de telas de malha fina em portas e janelas, evitando o acesso do vetor à residência. Canis e outros ambientes onde os cães e a família permanecem, também devem ser devidamente telados. Caso seja possível manter o cão em ambiente interno ou canil telado pelo menos à noite e no período crepuscular (entardecer), essa medida pode ajudar bastante na prevenção. Nesses mesmos locais, deve-se usar também inseticidas ambientais elétricos ou manuais.
Vacinação
A vacina para prevenção da Leishmaniose é relativamente recente, com pouco mais de 10 anos no mercado. Seu uso está indicado como uma forma de proteção individual dos cães, e não como uma ferramenta de saúde pública na proteção das infecções em humanos. Só pode ser utilizada por animais comprovadamente negativos na sorologia e com boas condições clínicas, seguindo estritamente o protocolo vacinal.
Evitar a proliferação do vetor
O fletobomíneo vetor da Leishmaniose se reproduz em matéria orgânica úmida, não na água parada como os mosquitos. Medidas como coleta e descarte adequados do lixo, limpeza de quintais, terrenos, recintos, vegetação e qualquer tipo de matéria orgânica, ajudam na prevenção. Deve-se também eliminar fontes de umidade.
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