03 de Fevereiro, 2019
|
News , Curiosidades e Dicas
Manejo da dor na medicina veterinária
Os médicos veterinários são considerados, pela sociedade, como peritos em saúde animal, bem como no tratamento e prevenção de doenças dos animais. Também são considerados uma referência na área do bem-estar animal. Consecutivamente, espera-se que sejam capazes de fazer julgamentos relativos ao bem-estar dos animais que estejam, ou não, sob o seu cuidado.
Com este conceito, a maior preocupação dos tutores e da sociedade como um todo, em relação aos animais, vêm de uma expectativa de vida mais alta do que há décadas atrás. Através deste direcionamento, a medicina veterinária evoluiu em suas especialidades, criando campos antes não conhecidos, aprimorando suas habilidades na prevenção e tratamento de patologias.
Contudo, essa vida mais longa proporcionada, traz uma maior probabilidade de aparecimento de doenças crônicas, em especial as que geram dor.
A dor aguda também se faz presente, mas geralmente recebe uma maior atenção por parte dos proprietários devido sua intensidade e por estar associada a problemas “repentinos” de saúde.
Seja ela aguda ou crônica, o manejo da dor é fundamental, afinal, além da questão ética que “obriga” os tutores e veterinários a proverem qualidade de vida ao pet, a dor pode levar a alterações em diversos sistemas orgânicos, piorando inclusive o prognóstico das enfermidades.
DEFINIÇÃO DE DOR
A Associação Internacional para o Estudo da Dor (International Association for the Study of the Pain) definiu a dor como sendo “uma experiência sensorial e/ou emocional desagradável, associada ou não ao dano potencial dos tecidos.
Atualmente, não temos mais dúvidas de que os animais são seres que também são capazes de sentir dor. Os estímulos nervosos que participam nas diferentes etapas das respostas aos estímulos dolorosos são essencialmente similares nos animais e no homem.
A incapacidade de se comunicar não nega a possibilidade do animal sentir dor e precisar de tratamento adequado, sendo assim, o conceito de que os animais, por situar-se na escala inferior evolutiva, não conseguem raciocinar e sofrem a dor com menor intensidade, contribui muito para este mal costume. Com sorte, os constantes avanços na área de “dor” trazem consigo um maior compromisso do médico veterinário para com o bem-estar do paciente e os protocolos terapêuticos atuais disponíveis, trazem mais reconforto à tarefa de tratar de impedir que a dor se apresente ou permaneça.
Apesar dos animais de estimação serem completamente domesticados, é natural e instintivo deles esconder essa sensação, como meio de proteção, principalmente em dores crônicas. Os cães, são capazes de se expressar melhor quando sentem dor, diferentemente de gatos. Portanto, é necessário olhar de perto os animais de estimação e tentar captar exibições sutis de desconforto ou dor, sem subestimar os sinais.
Dor aguda
A dor denominada aguda é aquela que surge repentinamente e tem sua duração limitada.
A dor aguda pode ser desencadeada por uma patologia ou estar associada a uma lesão crônica, podendo vir a desaparecer gradualmente à medida que os tecidos lesionados se curam ou não. Pode ser leve e durar apenas um momento, ou pode ser intensa e durar semanas ou meses, mas geralmente é mais intensa que a dor crônica e é um alerta do organismo de que algo não está bem. Sua persistência faz com que a mesma se desenvolva para a cronicidade.
Dor crônica
A dor crônica pode ser definida como a dor contínua ou recorrente de duração mínima de três meses; sua função é de alerta e, muitas vezes, tem a etiologia incerta, não desaparece com o emprego dos procedimentos terapêuticos convencionais e é causa de incapacidades e inabilidades prolongadas.
A dor crônica também pode ser considerada um estado de doença e é um fenômeno mais complexo. É a dor que supera o tempo normal de cicatrização, associando-se a uma doença ou lesão. A dor crônica pode surgir de estados psicológicos, e não tem um ponto final reconhecível.
A IMPORTÂNCIA DO CONTROLE DA DOR NOS ANIMAIS
É dever do médico veterinário e do proprietário prover tratamento adequado para dor, não somente por questões éticas, conforme falamos acima. O tratamento visa aliviar o sofrimento do animal, trazendo maior qualidade de vida. O alívio da dor traz benefícios psicológicos e sistêmicos também, reduzindo a morbidade da doença e facilitando a recuperação do animal.
CAUSAS DA DOR
As causas dos episódios dolorosos são inúmeras, desde traumas, doenças infecciosas, cirurgias, até doenças crônicas. No caso da dor crônica, as patologias comumente observadas na rotina clínica são doenças degenerativas, câncer, discopatia, osteoartrite, doenças periodontais, processos inflamatórios crônicos e dores pós cirúrgicas de natureza neuropática.
ALTERAÇÕES CAUSADAS PELOS ESTADOS DOLOROSOS
A dor é interpretada como uma ameaça à homeostase do animal, gerando uma resposta de stress no organismo. Durante o quadro estressante/doloroso, o sistema nervoso autônomo modifica diversos outros sistemas através da estimulação do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal, com a liberação de cortisol e catecolaminas pelas adrenais. Isso resulta em mudanças na frequência cardíaca e respiratória, pressão arterial e atividade gastrointestinal.
O stress gerado pela dor leva também à ativação de mecanismos neuroendócrinos com a secreção de hormônios da glândula pituitária, que causam efeitos duradouros no organismo. Várias funções podem ser afetadas, incluindo a resposta imune, reprodução, metabolismo e comportamento. As repostas orgânicas à dor são muito individuais, variando bastante. A dor não controlada pode levar a inúmeras consequências:
- Prolongar o tempo de recuperação da cirurgia, lesão ou doença;
- Imobilidade: recusam a se movimentar, podendo chegar a unirar e defecar sem abandonar o decúbito;
- Perda de peso e de massa muscular devido a anorexia – piorando o quadro como um todo;
- Constipação devido a incapacidade de se colocar na postura de defecação;
- Problemas urinários;
- Problemas comportamentais como: agressividade, lambedura excessiva, automutilação, entre outros. Frequentemente, a dor não é identificada como causa desses comportamentos, causando problemas como punições e abandono.
SINAIS E SINTOMAS RELACIONADOS À DOR
A dor sempre apresentará como sinal a expressão comportamental. Todos os problemas de comportamento que citamos acima podem ser considerados sinais de dor. Geralmente, os sinais incluem:
- Alterações na postura ou posição corporal;
- Vocalização;
- Alteração na reação ao toque;
- Alteração na interação com seres humanos;
- Alteração na mobilidade;
- Diminuição do apetite;
- Ausência de sinais de higiene corporal em gatos;
- Tentativa de se esquivar o tempo todo;
- Perda de motivação, apatia;
- Dores intensas podem causar depressão, imobilidade e ausência total de interação.
TRATAMENTO DA DOR
O controle da dor geralmente é feito com analgésicos e anti-inflamatórios. Sabe-se que os benefícios do tratamento superam os possíveis efeitos colaterais desses medicamentos. No tratamento de qualquer tipo de dor, o objetivo deverá ser tratar a causa primária quando possível, com a finalidade de eliminá-la ou, pelo menos, reduzi-la ao mínimo, associando o uso de medicamentos analgésicos.
A combinação de diferentes classes de fármacos analgésicos permite ao veterinário otimizar o manejo da dor. As classes mais utilizadas são os opioides e os anti-inflamatórios não esteroides (AINE’s). Os antidepressivos tricíclicos também vêm sendo utilizados como novas alternativas para o manejo da dor. Existem outras classes de fármaco que também podem ser associados, como corticosteroides, antagonistas de NDMA, anestésicos locais e agonistas dos receptores alfa-2 adrenérgicos.
OPIÓIDES
Os opioides têm eficácia elevada e são indicados para dores de intensidade moderada a severa. O seu efeito analgésico depende da droga escolhida, da dose, via de administração, e espécie à qual o fármaco é administrado.
Associação dos AINE’s com Opioides
Uma das principais recomendações para controle da dor passa pela analgesia multimodal. Trata-se da administração simultânea de fármacos de classes diferentes, buscando-se a melhor eficácia na menor dose possível. A combinação mais comum é de AINE’s com opioides. A Escada Analgésica da OMS – Organização Mundial da Saúde, indica uma padronização baseada em três níveis de acordo com a intensidade de dor que o paciente apresenta.
- O primeiro degrau corresponde a dores fracas, recomendando o uso de medicamentos analgésicos e anti-inflamatórios não esteroidais somente, sem a associação de classes terapêuticas.
- O segundo degrau se refere a dores moderadas, e sugere a associação de opioides fracos, que podem ser associados aos AINE’s do primeiro degrau.
- O terceiro degrau é de dores severas e sugere o uso de opioides fortes, associados aos anti-inflamatórios. Nos três degraus pode-se usar adjuvantes para complementar o tratamento.
Essa escada indica classes de medicamentos e não fármacos específicos, dando flexibilidade ao médico veterinário na escolha de acordo com o caso e as particularidades do paciente.
ANTI-INFLAMATÓRIOS NÃO ESTEROIDES – AINE’s
Os anti-inflamatórios não esteroides são fármacos que possuem efeito antipirético, anti-inflamatório e analgésico. A maioria das condições que causam dor tem um componente inflamatório. Constituem a base fundamental para o alívio da dor ligeira a moderada, e são indicados também para dor severa em associação com outras classes analgésicas. São administrados no período pós-cirúrgico, bem como estados de dor aguda e crônica. Na dor moderada a grave, devem ser usados como parte de um protocolo multimodal.
Os AINE’s agem sobre as prostaglandinas e outras substâncias liberadas em resposta às lesões. Essas substâncias estão diretamente envolvidas com mecanismos de inflamação, que tem como consequência edema, dor, rubor e calor. As enzimas COX-1 e COX-2 são responsáveis pela síntese de prostaglandinas, e a maior parte dos AINE’s agem diretamente na inibição dessas enzimas. A maioria dos AINEs faz a inibição da COX-1 e a COX-2, enquanto outros podem ter maior ou menor grau de inibição da COX-2. Os AINEs são classificados em não seletivos (cetoprofeno, aspirina, naproxeno, flunixina meglumina e outros), inibidores preferenciais da COX-2 (meloxican, etodolac, nimesulida) e inibidores altamente seletivos da COX-2 (coxibs).
A seguir, vamos falar sobre dois anti-inflamatórios não esteroides mais comumente utilizados para o manejo da dor em cães e gatos:
Meloxicam
O Meloxicam é um ácido enólico que pertence à classe oxicam de AINEs. O Meloxicam é um potente inibidor da ciclo-oxigenase, com maior ação na COX-2, sendo chamado de inibidor seletivo ou preferencial de COX-2. Acredita-se que a especificidade do COX-2 diminua a probabilidade de efeitos colaterais como lesões da mucosa gastrointestinal, alteração da função renal e plaquetária, em comparação com os AINEs que inibem ambas as enzimas COX. A seletividade de Meloxicam foi demonstrada por diversos estudos in vitro e ex vivo.
Meloxicam é considerado um anti-inflamatório seguro para tratamento de médio/longo prazo em cães. Em gatos, o Meloxicam é o único anti-inflamatório indicado para uso mais longo também, sem alterar a função renal.
Meloxicam para uso veterinário – MAXITEC ORAL
A Syntec traz uma novidade para o mercado veterinário> MAXITEC ORAL – anti-inflamatório em suspensão, à base de Meloxicam e com indicação para cães e gatos. Principais características do MAXITEC ORAL:
- Inibidor preferencial da COX-2, reduzindo a atividade da cicloxigenase – menos precursores da inflamação;
- Seguro para cães e gatos – sem reações adversas quando utilizado de acordo com a bula;
- Considerado o AINE de escolha para gatos;
- Não altera a função renal de cães e gatos, mesmo em tratamentos longos;
- Tripla-Ação: Além de anti-inflamatório, MAXITEC ORAL também é indicado como antipirético e analgésico;
- Suspensão oral com aroma de baunilha acompanhada de seringa dosadora – Sua apresentação facilita a administração em animais de pequeno porte, debilitados, com dificuldade de deglutição e aceitação de comprimidos, e em gatos;
- Apresentação: Frasco com 20mL acompanhado de seringa dosadora de 3mL.
Cetoprofeno
O Cetoprofeno é um inibidor inespecífico da COX , derivado do ácido propiônico, com potente e rápida ação analgésica. Este fármaco possui atividade antibradicinina – a bradicinina atua como mediador da inflamação, levando ao edema por aumento da permeabilidade vascular e vasodilatação. Além disso, possui importante papel na iniciação e manutenção da dor, pois aumenta a sensibilidade das terminações nociceptivas. Outra ação do Cetoprofeno é a inibição da lipoxigenase, promovendo analgesia por atuação no nível supraespinhal. A lipoxigenase é responsável pelos leucotrienos, que são mediadores inflamatórios. Por esses motivos, o Cetoprofeno é comumente indicado para o alívio de dores agudas, no pós-operatório e após traumas.
Cetoprofeno para uso veterinário – KENOVET
Outra novidade da Syntec é o KENOVET, anti-inflamatório em solução, à base de Cetoprofeno e com indicação para cães e gatos.
Principais características do KENOVET:
Potência: O Cetoprofeno é um inibidor de dupla ação, atuando tanto sobre a cicloxigenase (COX 1 e COX 2), quanto sobre a lipoxigenase, levando ao bloqueio duplo das respostas inflamatórias e celulares.
Atividade anti-edema: Possui atividade antibradicinina que se soma ao modo de ação clássica dos inibidores da enzima cicloxigenase, diminuindo o efeito da fase vascular do edema tecidual.
Fácil administração: Destaca-se por sua apresentação, solução oral, e vem acompanhada de seringa dosadora, que facilita a administração em diferentes situações, como animais de pequeno porte, debilitados, com dificuldade de deglutição e aceitação de comprimidos, e gatos.
Tripla-Ação: Efeito anti-inflamatório, antipirético e analgésico. Apresentação: Frasco com 20mL e seringa dosadora de 3 mL. Solução com aroma de baunilha.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BENNET, D.; ARIFFIN, S.M.Z.; JOHNSTON, P. Osteoarthritis In The Cat - 2. How should it be managed and treated? Journal of Feline Medicine and Surgery. v.14, p.76-84, 2012.
GRISNEAUX, E., et al. Effects of postoperative administration of ketoprofen or carprofen on short- and long-term results of femoral head and neck excision in dogs. J American Veterinary Medical Association. v. 223, n.7, p.1006-1012, 2003.
GOWAN, R.A., et al. A retrospective analysis of the effects of meloxicam on the longevity of aged cats with and without overt chronic kidney disease. J Feline Med Surg. v.14, n. 12, p.876-881. 2012
GRICHNIK, K.P; FERRANTE, F.M. The difference between acute and chronic pain. Mt Sinai J Med. v.58, n.3, p.217-220, 1991.
NIH - LiverTox: Clinical and Research Information on Drug-Induced Liver Injury. Meloxicam, 2015. Disponível em <https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK548278/>. Acesso em 11/2019.
OTERO, P.E. Dor: avaliação e tratamento em pequenos animais. [tradução: Mercedes Fernandez Sanabria, Rodrigo Fernandez Diaz, Luciana Ohara Camignotto]. – São Caetano do Sul, SP: Interbook, 2005.
SIEGFORD, J., COTTEE, S. AND WIDOWSKI, T. Opportunities for Learning about Animal Welfare from Online Courses to Graduate Degrees. Journal of Veterinary Medical Education, v.37, n.1, pp.49- 55, 2010.
WSAVA – Global Veterinary Community. Diretrizes para o Bem-Estar Animal da WSAVA. 2018.
WHO – World Health Organization. WHO's cancer pain ladder for adults. Disponível em <https://www.who.int/cancer/palliative/painladder/en/>. Acesso em 11/2019.
Conteúdos relacionados